"Poemas, reflexões e pensamentos"

Sou intrigante para os que não querem me conhecer a fundo, e instigante para os ávidos a descobrir meus segredos !



Desci aos Infernos...
Por: Lykos Duxty

Desci aos infernos e vi que existem demônios. Há anjos também, dentro de nós! Vi que não são tão feios como os pintam, os chifres desses demônios. Dá para encarar de frente e segurar pelos chifres!

Ouvi um dia que a religião é para aqueles que têm medo de ir para o inferno... e espiritualidade é para aqueles que já estiveram lá’! Aprendi que assim se faz verdade quando, descendo ao mais fundo do poço, sentimos nosso nome escrito na palma da mão carinhosa de um Deus Pai e Mãe, que de lá nos resgata para uma vida mais humana, quando nos descobrimos amados do jeito que somos!

Andei com o bravo Jorge da Capadócia enfrentando os dragões e muitos matei, mas sempre ressurgiam mais fortes; confesso haver me dado melhor com Santa Marta, que deu conta de domesticar seu dragão e ele se tornou guarda-costas para ela. Aí me lembrei de Paulo de Tarso e entendi porque que ‘quando sou fraco é que sou forte’...

Vi aquele velho sábio acalmar o povo na beira da praia, antes apavorado com o monstro que do mar subia todo o final de tarde e causava pânico na aldeia; e quando o velho sábio conseguiu que o povo, sentado à beira da praia, olhasse o monstro emergindo e dele falasse, o monstro sumiu por onde tinha surgido, porque os fantasmas existem enquanto neles acreditamos e por ele nos deixamos oprimir, até que, enfrentados, eles somem!

Vi aquele homem ficando cego e caindo no desespero quando a cegueira tomou conta dele definitivamente. Ouvi seu lamento e sua revolta, do fundo de sua mágoa com a vida; e vi um dia esse velho homem colocar a mão no ombro da cegueira e abraçá-la...e nesse dia, embora continuando cego, seu rosto voltou a sorrir.

Compreendi o enigma de Carl Jung, quando dizia que ‘o ser humano não se torna iluminado ao imaginar figuras de luz, mas ao conscientizar-se da escuridão’ e ouvi Caetano Veloso cantando na rádio que ‘cada um sabe a dor e a alegria de ser o que é’...

Dediquei-me à arte de domesticar dragões e alguns dei conta de domesticar, embora um dragão sempre seja um dragão e sempre carregue em si uma ameaça que pode emergir a qualquer momento. Isso me fez pensar que sempre é bom estar com ‘um olho no gato e outro no peixe’, e depois me lembrei novamente do grande psicólogo Saulo, aquele que acabou virando Paulo, graduado na escola do amor de Deus, quando dizia que ‘quem está de pé, cuide para não cair e quem caiu, que cuide de se levantar’!

Andei um tempo na companhia daquele velho monge que vivia mudando de convento, por nunca se sentir bem e perceber que ao fim de um tempo suficiente, tudo ia mal. E um dia vi esse mesmo monge assustado, quando depois de arrumar a mala para novamente se mandar em busca de novo convento, ouviu um estranho dizer do fundo de seu quarto: “eu sou o seu Ego...e se você está fugindo de mim, não adianta, porque para onde você for eu também vou”!

Essas andanças me ensinaram que o problema não são os “problemas”, mas a maneira como os encaramos! E depois percebi que ‘crescer é substituir um conjunto de problemas por outro conjunto melhor de problemas’. Foi bom encontrar essa resposta, para entender que a pessoa madura continua tendo problemas e o amadurecimento significa tão somente que se aprendeu a lidar com eles.

Nunca engoli direito aquela admoestação de ‘sede perfeitos como o Pai do Céu é perfeito’, simplesmente por não entender como poderia Ele querer perfeito o que Ele mesmo havia criado do barro... mas depois alguém me essa frase por ‘sede santos como o Pai do Céu é santo’ e explicou, a própria vida, que ser santo é bem diferente de ser perfeito! Aí me lembrei de grandes santos, conscientes de sua santidade e ao mesmo tempo se confessando grandes pecadores! Perfeitos não seriam, por terem a imperfeição do pecado; mas eram santos, por assumirem suas fraquezas e no meio delas se experimentarem profundamente amados por Deus. Ficou então combinado como coisa aceita e clara, que perfeição era esforço nosso e ilusão de super-homem, enquanto santidade era ação de Deus em nós!

E nessas idas e voltas, no meio de trevas e luz, Deus me ensinou o enigma do caminho de ser: crescer é descer e para ser mais é preciso ser menos!

Concordei então que era bom ser humano...pois até o próprio Deus achou bom tornar-se humano! Li no Eclesiastes que não adianta a gente querer endireitar o que o próprio Deus criou torto... e aí aprendi a ver a beleza que há na imperfeição e a perfeição que mora no limitado!

Comi o pão que o diabo amassou, mas acabei descobrindo, no meio de suor e de lágrimas, que não adianta viver mendigando dos outros ou das situações ou daquilo que fazemos, o amor e a segurança e o reconhecimento que só nós mesmos poderemos nos dar; ou aceitar gratuitamente ao nos deixarmos mergulhar na experiência do amor de Deus e nos abandonarmos em suas mãos.

No meio de muita prosa, encontrei um verso de Fernando Pessoa dizendo assim: ‘ a criança que fui chora na estrada. Deixei-a ali quando vim ser quem sou; mas hoje, vendo que o que sou é nada, quero ir buscar quem fui onde ficou’! E achei lindo, como o caminho a ser feito cada dia, sabendo que ‘o caminho se faz caminhando’!

Lembrei-me então do que me disseram: “há duas regras de bem viver: a primeira reza que não devemos nos preocupar com as coisas pequenas e a segunda decreta que todas as coisas são pequenas!”

Acabei aceitando, não sem antes ter resistido muito, que vemos os outros não como eles são, mas como somos e que há alguma coisa errada se estamos sempre certos!

Quando fui conhecendo aos poucos um pouco do mistério que eu sou, entendi que não devemos exaltar nossos ‘dons’ nem dramatizar nosso ‘pecado’. Cansei de ouvir Zé Ramalho cantando que ‘sentimento amordaçado volta a incomodar’ e depois aprendi que todo o sentimento é lícito: a maneira de canalizá-lo é que pode ser adequada ou não... e aí o apóstolo Paulo deu pitaco novamente, dizendo que, ‘se estiveres com raiva, toma cuidado para não caires em pecado’. Experimentei que deixar fluir os sentimentos que incomodam e dar-lhes nome e expressão... é segredo para viver em paz cá dentro deste mundo encantado.

Acabei encontrando mais um velho pergaminho do velho Paulo, dizendo que somos vasos de argila carregando um tesouro, e ouvi o salmista cantando que Deus sabe de que barro somos feitos e se lembra que apenas somos pó.

E no meio desse barro frágil e cheio de rachaduras, encontrei um velho contrato que eu mesmo assinei ao nascer e vi nele duas cláusulas que me chamaram atenção justamente por quase sempre as ter ignorado: 1) os problemas e os reveses fazem parte da vida, assim como os altos e baixos; 2) por sermos humanos, somos imperfeitos e falíveis, vulneráveis e frágeis.

Essa coisa de sermos imperfeitos ainda me deixou encucado durante um bom tempo, mas um dia acordei feliz por descobrir que ao dizer que somos imperfeitos, falamos também que somos aperfeiçoáveis.

Lembrei-me que meu velho amigo Mansur contou-me que Maomé havia dito: “se te conheces a ti mesmo, conheces a Deus!”... e se não me falha a memória Tereza de Ávila também dizia que “a melhor maneira de se chegar ao conhecimento de Deus é através do conhecimento de si mesmo!”

E enquanto termino estas pobres divagações pelas minhas memórias, ouço ao pé de meu ouvido Belchior cantando que “viver é melhor que sonhar”... e me lembro que Milton Nascimento também canta “já não sonho, hoje eu faço com meu braço meu viver”... mas, eis que de repente, me veio lá da fonte uma vontade de implicar, dizendo que ninguém vive sem sonho e que o sonho, se é para ser sonho, que seja grande! No mesmo canto Belchior dizia que “qualquer canto é menor que a vida”, mas lembrei ainda de outro poeta dizendo que “o sonho comanda a vida e sempre que a gente sonha o mundo cresce e avança”...

Hoje eu não brinco de ser Deus, invulnerável e onipotente; mas assumo que sou humano e isso me ensinou que o ser humano tem asas e é capaz de voar, sem tirar os pés da terra e do barro de que é feito!

Mas, para chegar a voar, foi preciso ter descido aos infernos!


Paz a todos
Beijos e abraços

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